AMAZONIA – UM MUNDO
VERDE. UM MUNDO DE SONHOS E FANTASIAS.
Vitória Régia - Simbolo da Região Amazônica |
Trabalhei no Instituto Hermes Pardini por 10 anos. Neste tempo todo passei viajando por todo o Brasil, divulgando o nome da empresa nos mais distantes rincões deste imenso pais. Fui do Oiapoque ao Chui e de 1996 a 2006, foram feitas parcerias com mais de 9000 laboratórios, que enviavam diariamente cerca de 25.000 amostras de pacientes para serem analisadas em Belo Horizonte. Foram milhares de quilometros percorridos em quase todas as estradas existentes, inúmeras viagens aéreas e algumas de navio. Algumas historias destas viagens já publiquei anteriormente, mas o fascínio que o nome Hermes Pardini provoca no leitores, me motivou a escrever uma boa historia sobre o maior estado brasileiro, a Amazonas e suas belezas.
Nesta publicação pretendo contar sobre minha viagem de carro à Boa Vista e Santa Helena na Venezuela, sobre as belezas de Manaus, a maravilha do encontro dos rios Solimões e Negro, quando começam verdadeiramente o Rio Amazonas, a descida de barco por este gigante até Belém, além de visitas nas cidades de Parintins, Óbidos, Oriximiná, Santarém, Belem e Macapá,
Teatro Amazonas - Simbolo da cidade de Manaus |
Tudo tem um inicio e meu trabalho na região norte começou por Manaus. Já conhecia a cidade de uma outra ocasião quando trabalhava para uma empresa de lista telefônica, mas agora a missão era outra. Implantar um escritório de apoio para atender os clientes locais do Hermes Pardini. Esta era a pior parte do projeto, pois embora tínhamos clientes espalhados por todo o Brasil, a empresa Pardini, não era tão conhecida como hoje e tinha muitos concorrentes disputando o mesmo mercado. Via de regra eu trabalhava da seguinte maneira. Ainda em Belo Horizonte, antes de iniciar uma viagem para uma região desconhecida, procurava fazer contato com algum cliente ativo e combinava que iria despachar para eles material de trabalho, que eu pegaria tão logo chegasse. Aproveitava também este subterfúgio para descobrir possíveis funcionários e quase sempre dava certo.
Chegando a Manaus, me instalei num hotel proximo a Zona Franca e aluguei um carro para visitar os laboratórios da cidade e como nada conhecia, passei o primeiro dia mapeando a cidade, marcando o roteiro que pretendia fazer, mas o mais importante passo era contratar o representante que iria dar sequencia nos trabalhos quando eu partisse.
Quando tudo estava planejado iniciei as visitas aos laboratórios, mas nas duas primeiras não obtive exito no quesito indicação, embora ficasse contente com a chegada do Hermes Pardini na cidade. Na terceira visita, fui visitar o Laboratório Benzecry e fui muito bem recebido pela proprietária, Dra. Andreia e durante nossa conversa, ela sugeriu que eu conhecesse seu irmão Samuel, que tinha experiência em vendas e estava desempregado no momento. Concordei em conhece-lo e marcamos um encontro para logo mais a tarde e quando ele chegou notei de imediato que ele tinha o perfil de pessoa que eu precisava. Acertamos os detalhes e ele foi contratado para ser o nosso representante, função que exerceu por mais de 10 anos com muito cuidado e responsabilidade.
Porto de Manaus - Movimento intenso todos os dias
Manaus, para quem ainda não teve oportunidade de conhecer é uma grande cidade, moderna. com um enorme parque industrial, um comércio forte devido a Zona Franca e também devido a industria do turismo. Situado à margem esquerda do Rio Negro, fica distante do Rio Amazonas uns 15 quilometros. Por ser uma cidade distante de outras capitais, só se chegava, na epoca, de avião ou de barco ou navio de porte médio. Hoje com a construção de uma ponte sobre o Rio Negro, já é possível, visto que o governo esta asfaltando, chegar a Porto Velho por terra e dali tem caminhos para todo o Brasil. Quando lá estive pela ultima vez, em meados de 2005, havia somente rodovia até a divisa com a Venezuela e para Itacoatiara.
Ponte sobre o Rio Negro que permite acesso a Porto Velho por terra.
Sempre tinha alguma novidade quando ia a Manaus. Certa ocasião a cidade estava sofrendo muito com as queimadas, tanto que quando o avião se aproximava da pista de pouso, somente a poucos metros do chão foi possível ver a vegetação em torno do aeroporto. A fumaça era tanta que conversando com um dos tripulantes da aeronave ele disse que naquelas condições, o pouso somente poderia ocorrer por instrumentos, pois não se enxergava nada da cabine da aeronave.
Também, devido as queimadas, a energia elétrica da cidade, que era fornecida por usinas movidas à óleo e com isso havia um racionamento em toda cidade. No hotel que eu estava hospedado a força era desligada às 9:00 horas e religadas às 17:00 horas. Eu, nesta viagem, fiquei por lá uns 20 dias.
Num final de semana, minha esposa veio me visitar, pois estava fora de casa à quase 03 meses e enquanto eu saia para trabalhar, ela ia passear nas lojas da Zona Franca e numa vez, ela resolveu jogar no bicho. Apostou R$ 5,00 no Pavão e para sua surpresa, a tarde, quando passou no cambista, soube que havia ganhado R$ 100,00. Vocês nem podem imaginar a alegria dela. Sorte de principiante, pois até aquele dia nunca havia jogado.
Encontro das águas do Rio Negro com o Solimões - Inicio do Rio Amazonas
O final de semana foi muito agitado. O Samuel tinha arrumado com um guia canoeiro, um passeio pelo Rio Negro até o encontro com o Rio Solimões, dando inicio ao Rio Amazonas. Foi um passeio inesquecível, pois além de chegarmos bem no meio dos rios, onde as águas não se misturam, tivemos oportunidade de conhecer as vazantes dos rios, chamados de “parana”, onde moram muitos ribeirinhos. Depois, fomos levados por dentro da floresta, por caminhos que o guia conhecia, até um restaurante instalado num tablado flutuante em um grande lago. Foi servido uma das melhores refeições de peixe que se podia esperar. Rodizio de tucunaré, tambaqui e pirarucu e muita cerveja.
Peixes das mais variadas especies. Esta é a culinária local
Voltamos para Manaus no final do dia e já tínhamos um programa legal para o dia seguinte: iriamos subir o Rio Negro num barco de 18 metros, pertencente ao um parente do Samuel. Foi inesquecível fazer um churrasco numa praia deserta de areias brancas na companhia de mais 30 pessoas. Junto com o barco, o parente da Samuel levou também uma lancha e um jet ski e foi a primeira e ultima vez que tive oportunidade de dirigir uma lancha, por pouco tempo, e dar uma volta de jet sky.
Voltamos para Manaus já no começo da noite e chegamos cansados no hotel, mas ainda sobrou tempo para tomar um tacacá, uma iguaria deliciosa, feita com goma de mandioca, tucupi, jambu e camarão. No dia seguinte, minha esposa voltou para São Paulo e eu fiquei trabalhando mais uns dias com o Samuel. Estávamos na Semana Santa. Eu iria na sequencia para Belém e como teria uns dias de feriado, resolvi abrir mão da viagem aérea e ir de barco, viagem que demoraria 05 dias.
Comprei um camarote neste navio e o preço era muito barato considerando o tempo de viagem, com refeições inclusas. Não tive a curiosidade de conhecer o navio antes da partida e quando cheguei no porto, notei que se tratava de um catamarã, todo de ferro, com uns 50 metros de comprimento e uns 15 metros de altura. O Samuel me ajudou a levar a bagagem até o camarote e ai notei que haviam apenas dois apartamentos para passageiros do lado direito do navio e dois do lado esquerdo. Eu ocupei um deles e uma familia ocupou o outro. Esta familia fez um trecho curto, somente até Parintins. Do outro lado, os camarotes eram utilizados pela tripulação. Por outro lado, em dois pavimentos abaixo do plano onde estavam os camarotes e a sala de comando do navio, haviam mais de 700 pessoas, todas em redes.
Era uma cena chocante e me senti muito mal em ver aquilo. Eu usando um apartamento com cama espaçosa, ar condicionado e logo abaixo, 700 pessoas em rede, sofrendo com o calor, chuva e com a falta de higiene, pois os banheiros eram imundos. Mas era muito barato. Não tenho idéia da epoca, mas se colocarmos no valor de hoje, eu teria pago pelo camarote por 05 dias, com refeições inclusas um valor semelhante a R$ 450,00, enquanto os que viajavam na rede estariam pagando um valor equivalente a R$ 150,00.
Na calmaria do gigante, milhares de quilometros de água e florestas
Na cobertura, quase ao lado dos camarotes, funcionava uma lanchonete e lá era o encontro do pessoal. Com o calor intenso, o consumo de cerveja era bem alto e fiquei muito amigo da tripulação, depois de pagar algumas duzias de cervejas para eles. A viagem é linda e recomendo a todos um dia, se puderem que a façam. O Rio Amazonas é magico. Tem lugares que ele tão largo, que não se consegue enxergar a outra margem e tem um trecho, que ele fica estreito, perto de 02 quilometros de largura, mas neste ponto, perto da cidade de Óbidos, a profundidade, chega a mais de 1500 metros.
A primeira escala foi na cidade de Parintins, a capital brasileira do Festival do Boi. A parada ali foi rápida. Cerca de duas horas, mas foi o suficiente para conhecer rapidamente uma pedacinho da cidade, onde prevalece, nas casas, as cores vermelha ou azul, dependendo de que time o morador é torcedor. Se do Boi Garantido (vermelho) ou do Boi Caprichoso (azul). Todo ano, ali é realizado um festival, que se assemelha muito com o Carnaval do Rio de Janeiro, onde existe a disputa do melhor desfile entre as duas agremiações.
Seguindo a viagem, outro detalhe que me chamou a atenção foi o carregamento de açaí. Em pontos já previamente combinados, o navio toca uma sirene e reduz a velocidade da embarcação. Nisso, pessoas manobrando canoas apenas no remo, se aproximam do navio, que não para, se amarram ao barco por cordas e transferem balaios cheios da fruta. Quando a operação termina, eles se soltam do navio e voltam para suas casas, todas casebres, à beira do Rio Amazonas, cercadas de arvores por todos os lados. Este procedimento de se repetiu por diversas vezes durante a viagem e acontecia inclusive durante a noite. Quando o navio aportou em Belém havia mais de 100 balaios de açaí.
Outra cena que ficou gravada na memória foram as crianças dos ribeirinhos. Pilotando uma pequena canoa, meninos e meninas, alguns com idade aparente de 05 anos, iam de encontro ao navio e ficavam acenado para os passageiros jogarem coisas para eles. Parece que já era um costume estabelecido, pois eram atirados dezenas de sacos plásticos, uns com roupa, outros com comida e ai se notava a pericia daquelas crianças em manobrar suas canoas para recolher os pacotes lançados.
Visto do alto, o Rio Amazonas em alguns trechos é um enorme emaranhado.
A viagem que durou 05 dias, teve muitos momentos inesquecíveis, mas não posso deixar de relatar a parada do navio em Santarem. Ali ficamos parado por umas 05 horas, tempo necessário para o navio ser carregado com uma enorme carga de peixes, Dentro do navio havia uma grande câmara frigorifica e os peixes eram retirados de caminhões estacionados num plano mais alto e jogados diretos para o navio através de uma rampa feita especialmente para isso. Não consigo imaginar a quantidade de peixes e tamanhos que foram embarcados, mas eram muito peixes. Mas o que me chamou mais a atenção foi o que vi no Porto de Santarém: uma floresta de madeira cortada (mogno), embalada, pronta para ser embarcada para a Europa. Podem imaginar uma linha de uns 150 metros de comprimento, por uns 05 metros de altura e 05 de largura. Bem este era o volume de madeira que estava a espera de um navio para ser enviado para algum pais europeu. Fiquei indignado com a cena, mas creio que a mesma se repete até os dias de hoje.
Milhares de árvores são transportadas pelos rios da região
Para completar a viagem, até a chegada à Belém, tenho que relatar como era servido as refeições. A comida era igual para todos, tripulação e passageiros. Eram servidos num grande salão em horários previamente agendados. Café da manhã, almoço e jantar. Mas o diferente era o tratamento. Dentro do salão, havia uma pequena sala, toda fechada com vidro e com ar condicionado. Ali é que era servido as refeições para a tripulação e para mim, o único passageiro que viajava nos camarotes. Os outros passageiros também eram servidos, mas em mesas colocadas ao longo do salão, sujeitos às intempéries do tempo.
Esta viagem foi inesquecível, mas teve outra com muita mais emoção, quando resolvemos ir a Boa Vista de carro, abrindo mão da passagem aerea, que tínhamos direito.
Nesta viagem eu já tinha o escritório montado e uma secretária eficiente que ajudava o Samuel na coleta dos exames. Eu estava programado para fazer a viagem até Boa Vista de avião, mas pelo espirito de aventura, resolvi faze-la de carro. O Samuel tinha um chevette e combinamos que iriamos sair cedo para chegar ao entardecer na capital do Acre.
Iniciamos
a viagem por volta de 09 horas e ao chegar na primeira cidade, Presidente
Médici, resolvemos não abastecer, contando que íamos encontrar postos de combustíveis pela
estrada. Seguimos a viagem tranquilos até a chegada de uma reserva índia,
controlada pelo Exercito. Fomos parados e instruídos que não poderíamos parar
em parte alguma da estrada dentro da reserva, pois corria risco de ser atacados
pelos índios que lá habitavam. Não havia socorro, não havia nada. Era acelerar
e atravessar os 160 quilometros de estrada sem nenhuma parada. Normalmente,
você percorre uma distancia desta em uma hora e pouco, mas dentro da floresta é
diferente. Primeiro, devido a quantidade e altura das árvores, tivemos que
fazer toda a viagem de farol ligado. Não tinha espaço para o Sol jogar sua luz
na estrada, salvo em pequenos trechos. Mata fechada o trecho todo. Não vimos
uma alma viva siquer, nem índio, nem bichos. Mas durante a travessia, que durou
quase 02 horas, o coração batia acelerado.
Quando
terminamos a travessia da reserva, tinha um pequeno posto de gasolina, mas sem
gasolina. Era apenas um posto. Não tinha nada. Compramos um refrigerante e
tivemos a informação que a 120 quilometros à frente tinha um posto de gasolina.
Nesta altura, o odômetro marcava meio tanque e ainda faltava mais de 400
quilometros para chegar. O combustivel iria acabar antes. Seguimos viagem,
atravessamos a Linha do Equador e quando chegamos no tal posto, para nossa
decepção e preocupação, também não havia gasolina para vender. Ainda restava
uns 300 quilometros para chegar e pouco mais que um quarto de gasolina. Ai
começou realmente a aventura. Começamos atravessar dezenas de igarapés, todos, literalmente todos, com as pontes quebradas. Cada uma delas tinha um jeito de
atravessar, até passando pelo igarapé, com a água chegando no assoalho do carro,
mas o que mais preocupava ainda era o combustivel. Estava acabando.
Na viagem para Boa Vista passamos pelo marco que indica a linha do Equador
Começamos
a dirigir em ponto morto. Acelerava o carro até ganhar velocidade e ai jogava
ponto morto e deixava ir até quase parar e depois acelerava novamente. Uma hora
fiz um teste e desliguei o motor e rodamos um longo trecho com o carro
desligado e passamos a trabalhar desta maneira, mas mesmo assim, o combustivel
estava acabando. De repente, acende a luz de reserva e ainda faltava uns 80 quilometros para Boa
Vista. Tinha começado a chover e ficar escuro. O movimento na estrada era
minimo, de vez em quando cruzava um caminhão, mas era muito pequeno o
movimento. Já estavamos conformados com a idéia de ter que dormir no carro,
quando do nada, aparece uma luzinha. Era
um posto de gasolina. Chegamos lá praticamente com 100 ml de combustivel no
tanque. Foi um presente da Deus.
Só
de imaginar dormir a noite ao relento, em plena Floresta Amazônica, já é bem
complicado, agora se realmente tivesse acontecido, hoje, certamente, estaria
contando uma historia de terror. Chegamos em Boa Vista por volta de 19:00 horas.
Lamentei muito ter vindo de carro. Poderia até voltar de avião e deixar o
Samuel voltar sozinho, mas ai seria muita sacanagem.
Trabalhamos
quatro dias em Boa Vista, contratamos uma vendedora, visitamos todos os
laboratórios da cidade e retornamos a Manaus. Enchemos o tanque e pelos cálculos, daria para chegar em Presidente Figueiredo. Lá colocaríamos combustivel novamente e dava para chegar com folga a Manaus. Só que quem quer voltar para
casa, sempre anda um pouco mais depressa. Essa parece ser a regra. Foi o que aconteceu.
Voltamos um pouco mais depressa e não deu outra. A 15 quilometros de Presidente
Figueiredo a gasolina acabou. Paramos no acostamos e o Samuel pegou uma carona
e foi até a cidade buscar combustivel. Por conta disso chegamos em Manaus já
bem a noite.
O duelo dos bois Garantido e Caprichosos tornaram Parintins um centro turístico nacional
Manaus sempre me trás grandes recordações, mas não posso deixar de contar a beleza que é o Festival dos Bois Centro de Convenções de Manaus, o encontro entre os grupos folcloricos Caprichoso e Garantido. É como uma disputa de final de campeonato brasileiro. Arquibancadas lotadas, os Caprichosos, vestidos de azul e o time do Garantido de vermelho, a cor que o Samuel usava tocando um enorme bumbo. Tudo isso regado a cerveja gelada e muita alegria, afinal, nem tudo era trabalho.