terça-feira, 30 de junho de 2020

A MAGIA DA VENDA




Nos últimos 35 anos de minha vida sempre trabalhei com algum tipo de vendas. Minha primeira experiência aconteceu quando ainda era garoto, talvez uns 12 ou 13 anos e consegui um emprego para trabalhar num bar de uma estação ferroviária com um tabuleiro para vender doces e biscoitos  aos passageiros de trem. Era engraçado a gritaria, “Olha o biscoito, olha a rosquinha de leite” e eramos em vários moleques e durante o dia, atendíamos diversos trem. Foi o inicio de tudo.

Apenas uma foto lembrança para ilustrar o tema.

Tempos depois, encontrei dois irmãos que estavam vendendo um tecido chamado JK bordado. Era uma venda contra pedido.  A gente levava o mostruário e visitava as donas de casa das cidades da região. Era normal vender cerca de 10 pedidos por dia, mas o inesquecível era o almoço: todo dia, pão, mortadela e guaraná.

Ai, o tempo de venda cessou, entrei para trabalhar no almoxarifado de um construtora e lá permaneci por 04 anos. Quando deixei esta empresa, meu pai conseguiu, através de um amigo, um emprego numa empresa de representação de tecidos e confecções de cama, mesa e banho, na cidade de São Paulo para atender o Estado de São Paulo e parte de Minas Gerais.
 
Eram dezenas de mostruários
Todo orgulhoso do meu feito, cheguei em casa vindo de São Paulo com duas enormes malas de mostruário, com diversos tipos de tecido, como tergal, gabardine, tricoline, popeline e até o mais famoso deles o linho york street, além de amostras de toalhas de mesas, toalhas de banho, roupão de banho, lenções de casal, de solteiro, de bebê, enfim, uma infinidade de produtos e como estava começando e não tinha experiência, me recordo até hoje da primeira venda,que aconteceu numa pequena loja de armarinhos.  Eu entrei na loja de armarinhos todo suado, pois não tinha carro ainda e comecei a mostrar a mercadoria de qualquer maneira, sem saber o que era uma coisa ou outra e talvez para me ajudar, esta primeira cliente, comprou de mim, alguns jogos de toalhas, uma compra pequena, mas que rendeu uma primeira lição, que levei para a vida toda:

Conhecer seu produto e a necessidade do seu cliente é fundamental para a realização de uma venda.

Foi importante para minha vida, a partir deste dia me preparar para visitar um cliente. Inicialmente por que as malas pesavam muito, segundo por que não tinha carro e terceiro, o que eu estava oferecendo nem sempre interessava ao cliente.

Comecei então, a me espelhar nos outros vendedores da empresa, que faziam o planejamento do trabalho a ser feito no dia, na semana e no mês e comecei a imita-los e as vendas começaram acontecer. Se eu planejasse visitar lojas de tecidos, eu separava mostruários que serviriam para aquele cliente e assim fui evoluindo e meu serviço foi deslanchando.

Planejar o trabalho, visitar o cliente certo com o produto certo é que todos vendedores devem fazer.

A partir de então, passei a me relacionar melhor com os clientes e fui criando uma carteira de clientes fidelizados, que todo mês compravam de mim e assim, minha experiencia como vendedor de tecido e confecções foi meu primeiro passo na carreira que escolhi para mim. Ainda tinha muito que aprender e embora estivesse com uma boa quantidade de vendas, aprendi uma dura lição, que me fez repensar a profissão:

Prometer e não cumprir é perder o cliente para sempre. É fundamental cumprir o que ficou combinado, dentro do prazo combinado.

Vou esclarecer o exemplo acima. Quando vendia tecido, fiz uma grande venda para uma industria de camisas. Era a minha maior venda, mas para meu desencanto, a fabrica não aceitou o pedido, pois já havia vendido um pedido maior que o meu para outro cliente e não tinha condição de produzir mais.  Nunca mais este cliente me atendeu. E com isso, minha carreira nesta área se encerrou.

Um mercado fantastico, cheios de desafios.

Tempos depois, já mais maduro, fui trabalhar num outro segmento: concreto usinado. Neste mercado, na epoca, havia muita duvida da sua utilização, pois quando um cliente contratava uma construtora ou mesmo um empreiteiro, o serviço de fazer o concreto na obra já estava incluso no preço da obra. Foi preciso desenvolver uma outra lição:

A missão do vendedor é atingir plenamente a necessidade do comprador e para isso ele precisa ter argumentos fortes e convincentes para fazer o comprador mudar sua forma de enxergar a situação.

Não se constrói nenhum imóvel sem o uso do concreto, portanto, este material é indispensável em qualquer obra. Mas embora isto seja uma realidade, os compradores ficavam relutantes em pensar que estavam pagando duas vezes pelo mesmo produto. Ai entrava a argumentação que o produto usinado era de melhor qualidade, que o empreiteiro ou a construtora poderia oferecer um desconto e assim a venda se concretizava. Hoje a realidade é diferente e o concreto usinado passou a ser obrigatório em qualquer construção, mas quando comecei, era tudo muito difícil, mas desenvolvi muito a técnica do convencimento.

Vou citar uma frase de Katherine Barchetti, que deve estar gravado na memoria de qualquer pessoa que pretende ser ou já é vendedor:

Não faça uma venda. Conquiste um cliente.

Iniciei um novo desafio na minha carreira; me tornei vendedor de publicidade em lista telefônica. Neste segmento, você vende apenas sonho. O cliente, via de regra, não esta esperando a sua visita e você chega, explica rapidamente o que esta fazendo, o cliente, muitas vezes sem entender bem o que esta comprando, assina um contrato de publicidade e seu anuncio vai aparecer no catalogo telefônico daí a alguns meses. Foi a maior escola de vendas, pois diariamente visitava 10 a 15 clientes que nunca tinha visto e cada um havia uma abordagem diferente e depois disso, nunca mais encontrava este cliente, pois o trabalho era muito dinâmico. Era cada dia  numa cidade por todo o Brasil. Milhares de visitas, milhares de não e centenas de sim. E vem mais uma lição:

O vendedor tem que ser persistente, ambicioso, não se deixar abater pelo fracasso de receber um não e estar sempre pronto e otimista para enfrentar um novo cliente, quantas vezes for necessário, até atingir a sua meta estabelecida.

Numa nova etapa da minha carreira, passei a condição de supervisor e nesta função, minha missão era orientar os vendedores, estabelecer metas, ajuda-los nas vendas. Foi como olhar do outro lado espelho. Eu percebia neles os erros que eu havia cometido e em reuniões semanais, trocávamos experiencias e a cada semana, nosso trabalho crescia, nos levando a liderança.

A função do líder é dar tranquilidade e confiança a sua equipe para que eles realizem suas tarefas com prazer e determinação.

Por 05 longos e inesquecíveis anos neste mercado, me deu base gerencial para um novo desafio; mercado de analises clinicas. Por ser um mercado técnico, o obvio que um gerente deveria ser alguém também técnico, mas tem uma verdade, que é minha:

Um vendedor pode vender qualquer serviço ou produto, mas um especialista nem sempre poderá realizar a tarefa do vendedor.


Analises clinicas: um mercado técnico 

Tinha um desafio. Uma missão: montar uma equipe de vendas em todo território brasileiro com a proposta de ter como cliente todos os laboratórios de analises clinicas e hospitais do Brasil. Tarefa quase impossivel, mas ao longo de 10 anos, consegui, junto com minha valiosa equipe de mais de 100 excepcionais vendedores, atingir 70% do mercado, tudo graças a fatores indispensáveis para o sucesso de qualquer empresa:

Planejamento, objetivos, suporte técnico e financeiro, capacidade de suportar crescimento de demanda e ter fidelização do cliente, oferecendo sempre a ele o melhor serviço, o melhor atendimento.

O tema Vendas é emocionante e em poucas linhas é quase impossivel descrever tudo que esta profissão fantástica oferece, mas hoje com a tecnologia do lado, ela pode ter-se tornado um pouco mais impessoal, mas isto obriga o vendedor a se preparar mais para os desafios que a vida moderna impõe.

Um pensamento para refletir,

O único meio de evitar erros é adquirindo experiencias, mas a única maneira de adquirir experiencia é cometendo erros- (Lair Ribeiro)

quinta-feira, 25 de junho de 2020

A QUADRILHA JUNINA DE POTYCABANA

Teresina -  A Rainha do Nordeste

Minhas viagens pelo Brasil me ensinaram muita coisa. Foram anos e anos indo do norte ao sul do leste ao oeste. Conheci centenas de cidades, viajei por quase todas estradas do Brasil, fiz diversos vôos e até viagem de navio. Como diria Roberto Carlos, “foram tantas emoções”.

Em cada parte deste Brasil, que é muito maior que a maioria da população conhece apenas pelos noticiários da imprensa, tem uma boa historia para ser contada, uma pessoa especial para ser conhecida e tenho feito ao longo dos anos, publicações neste sentido e agora resolvi contar sobre o Estado do Piaui.

O Piauí e seus vizinhos

Geograficamente, o Estado do Piaui se localiza na região nordeste e pelo seu tamanho, faz divisa com o Ceará, Pernambuco, Bahia, Tocantins e Maranhão e tem o menor litoral do Brasil, com apenas 66 quilometros de extensão, que mesmo pequeno, é um dos mais bonitos do Pais.

O Estado tem 224 municípios, sendo Teresina a sua capital e as principais cidades do interior são Parnaíba e Picos. A capital é cortada por dois grandes rios: O Rio Parnaíba que no encontro com o Oceano Atlântico forma uma das maiores belezas da natureza conhecida como o Delta do Parnaíba e pelo Rio Poty, que cruza o centro da cidade e torna-se um afluente do Parnaíba quilometros a frente.

Teresina é considerada a “Rainha do Nordeste”, é a única capital nordestina fora do litoral, e no século passado era conhecida como a Mesopotâmia do Nordeste por se encontrar entre os dois grandes rios e hoje ela é muito projetada e arborizada, conhecida como “Cidade Verde”.

Boeng 707 que operava na epoca

Estava trabalhando na região nordeste e até então só conhecia aquele lugar por uma escala no aeroporto local, onde avião da VASP ficou no solo por uns 30 minutos e quando lá cheguei, anos depois, vindo de Fortaleza, confesso que enfrentei a pior estrada que havia passado até então. Ao entrar no Estado do Piauí, a estrada estava toda esburacada e foi quase um dia todo para cumprir os 600 quilometros que separam as duas capitais.

Na primeira viagem, a estrada era só cratera, sem sinalização

Durante a viagem, um quadro que se repetia sempre: pessoas à beira da estrada com uma fieira de “voante” limpa para vender aos motoristas. Fiquei sabendo posteriormente que a “voante” era a codorna, um pássaro pequeno, mas muito consumido pelo piauense, inclusive este prato é encontrado em diversos restaurantes da cidade, que aliás, também são especialistas em peixes e é impossivel esquecer as moquecas servidas no Restaurante Dona Maria ou um farto almoço às margens do Rio Poty no tradicional “O Pesqueirinho”, que recomendo a quem ler este artigo e visitar Teresina.

Minha ligação com esta cidade aconteceu muito tempo atrás, por volta de 1994, quando era funcionário do Laboratório Lid. Esta empresa tinha uma coligada chamada CPEI, que estava ampliando sua rede de distribuidores pelo Brasil. Certa ocasião, visitando um cliente na cidade de São Paulo, encontrei na recepção do laboratório que eu visitava, uma loira bonita, falante, perfil ótimo para vendas e já atuava na área de reagentes. Durante a nossa conversa, ela disse que era de Teresina e estava pensando em voltar e lá abrir uma distribuidora de produtos para laboratório. Fiz a ponte entre ela e o Dr. Renne, que era diretor da CPEI   e ela passou a ser a representante da empresa no Piaui, Nascia ali a Kris Lab Comércio e Distribuição Ltda, hoje uma empresa consolidada no mercado.

Quando eu estava em processo de expansão do Laboratório Pardini, eu tinha que contratar um representante para atender os clientes do Piaui e como fazia em todos lugares onde chegava pela primeira vez, eu visitava os laboratórios e perguntava sobre a indicação de alguma pessoa para nos representar e quase sempre dava certo e em Teresina aconteceu um fato que me deixou de cabeça quente, Visitando o maior laboratório da cidade, o Med Imagem, que já era nosso cliente, perguntei ao sócio do laboratório, Dr. Erasmo se conhecia alguém para indicar e ele prontamente disse: minha esposa Nathalia.

Prédio do Med Imagem

E agora? Se eu declinasse a indicação, poderia abalar a relação comercial que já existia e se contratasse a Nathalia, poderia a vir ter problema com os outros laboratórios, devido ela ser esposa de um concorrente,  e esta situação me preocupava bastante, mas resolvi arriscar e marquei uma reunião com a Nathalia e para minha surpresa, ela tinha o perfil que eu esperava para nos representar. Tivemos ao longos dos 03 anos que nos representou alguns problemas, mas posso dizer que fez seu trabalho com relativo sucesso.

Quando ela manifestou desejo de não mais continuar, pedi para o vendedor de Fortaleza, o Reginaldo Silveira, ir até Teresina e contratar uma nova equipe e lá ele contratou um garoto bom de serviço, que fez uma boa amizade com todos os donos de laboratórios, o que não acontecia com a Nathalia e a nossa produção na região teve um aumento significativo. Fui conhece-lo meses mais tarde e ficamos amigos, amizade que dura até os dias de hoje. Hoje, o Eugênio é um construtor de sucesso, Montou uma empresa de limpeza de terrenos e outros serviços e em seguida conseguiu construir uma primeira casa e daí surgiu a Construtora Projetar.

Meu amigo Eugênio conseguiu transformar seu sonho em realidade

Em Teresina tem um parque público, muito bonito, com o nome sugestivo de Potycabana. Localizado às margens do Rio Poty o mesmo conta com uma estrutura espetacular, pouco vista em outros lugares do Brasil, como ter uma área de 43 mil metros quadrados, sendo 15 mil metros quadrados de área verde, pista de caminhada, pista para ciclismo, esporte radicais, 08 quadras de esportes e outros atrativos. Um lugar para conhecer.

Eu estava em Teresina no mês de junho e no Potycabana tinha uma festa popular, como muitas barracas, parques de diversão e havia na programação, um concurso de quadrilhas juninas. Confesso que minha lembrança deste tipo de tradição era apenas o das festinhas que as professoras faziam com as crianças nas escolas e confesso que não manisfestei interesse de imediato em participar do evento, mas acabei me rendendo as musicas alegres que vinham do evento e encontrei um lugar na arquibancada e ai fiquei extasiado. Foi a melhor momento da minha viagem e um dos melhores que vi até hoje, Um teatro ao ar livre, com centenas de personagens.

Festa Junina no Parque Potycabana

O torneio, fiquei sabendo depois, é encarado como uma competição profissional e grupos de várias cidades treinam os passos da dança diariamente, durante o ano todo, e se apresentam em concursos por todo o nordeste. Os campeões ganham direito de participar dos concursos em Caruaru (PE) e Campina Grande (PB), os templos sagrados dos festejos juninos.

Uma dança frenética e cheia de magia e beleza

O ritual da dança é sempre o mesmo, um casal que é obrigado a casar sob a mira de uma espingarda, um padre que faz o casamento e depois a dança para comemorar o casório, mas isto feito profissionalmente é espetacular. A sincronia, a variedade de passos, a velocidade que os dançarinos empregam na dança é fantástico e a coreografia é julgada por uma banca e como nos desfiles de escolas de samba, tudo é cronometrado. Ultrapassou o tempo, é penalizado.

Pena que este ano, por conta da pandemia, não houve este encontro e o São João, que para o nordestino tem um apelo popular imenso, ficou o vazio, mas certamente, no coração do piauiense, a dança esta gravada intensamente no coração de cada um.

Já fazem muitos anos que não volto por lá e por não mais viajar a trabalho e morar muito distante, talvez nunca mais volte, mas Teresina ficou gravado no meu imaginário como um dos lugares mais encantadores que tive o prazer de conhecer.  Saudades dos meus amigos Anderson, Nathalia,  Nayane, Manoel e Erasmo.  Saudades também do calor, da brisa a tarde à beira do Poty e de uma gostosa garrafa de cajuína. Oxalá que eu volte um dia.








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quarta-feira, 17 de junho de 2020

9200 VISUALIZAÇÕES


No dia 12 de janeiro de 2017, resolvi escrever um diário sobre minhas viagens e não tinha nenhuma pretensão, a não ser registrar para que um dia algum familiar pudesse encontrar estas historias. Um diário, depois de alguns dias, acabou sendo um projeto sem sentido, pois não conseguia escrever tudo o que queria e daí surgiu a ideia de criar um blog. O nome escolhido foi bastante sugestivo “Vendedor de Sonhos”, o que de verdade, eu, e todos os vendedores somos. Vendemos a necessidade de outros. Precisava de um nome para o blog e como havia passado muitos anos numa empresa de lista telefônica, adotei o nome


Usando este nome, comecei a contar minhas historias como vendedor a partir de 1985, quando fui contratado pelo Editora de Lista Telefônica – LTN, para seu quadro de vendedores e lá permaneci até meados de 1989, quando já ocupava o cargo de supervisor. Nesta empresa trabalhavam centenas de vendedores e atuávamos em todo território nacional durante o ano todo e nossas vidas eram estradas, clientes, hotéis e quando dava, voltava pra casa para visitar a familia.

Foram anos de muito trabalho, muita dificuldade, principalmente no inicio, mas hoje, passado mais de 30 anos, valeu a pena cada minuto e o aprendizado daqueles anos foram a base para o sucesso que obtive em outras empresas e outros segmentos.

Voltando ao blog, ao longo destes anos, publiquei um sem números de historias e como disse, sem nenhuma pretensão a não ser registrar minhas memórias, mas com o tempo, as pessoas foram descobrindo o blog e meus escritos começaram a ser lidos e isto me motivou a continuar escrevendo sobre viagens, lugares e pessoas e esta semana, o blog chegou a um numero de visitantes que considero fantástico, considerando que não sou escritor profissional, apenas um amador, que provavelmente comete alguns erros durante a escrita, mas o numero que me impressiona é este 9.200 visualizações até o momento que escrevo estas linhas.

Quero agradecer a todos que estiveram comigo todo este tempo e confessar que nunca esperava nada disso. Minhas historias chegaram a lugares que eu nunca estive e foram lidas por pessoas que jamais conhecerei, mas é muito gostoso ter este reconhecimento.  Bem, já que cheguei até aqui, só me resta continuar. Novas historias, novas homenagens virão no futuro e espero continuar contando com a colaboração de todos.

Hoje vou publicar meu primeiro artigo, que escrevi no dia 12 de dezembro de 2017.
Abraços a todos.


Capitulo 1 – Em busca de um sonho

O Natal daquele ano seria o pior de todos os tempos. Não havia dinheiro para comprar nem uma simples lembrança para as crianças que moravam junto com a mãe na cidade de Descalvado, onde para ajudar no orçamento, a Zezé,minha esposa,  ia diariamente com meus filhos, apanhar algodão numa fazenda próxima. O que ela conseguia dava para comprar o pão e o leite das crianças e o que eu contribuía, dava para pagar o aluguel e comprar alguma comida. Eu trabalhava na cidade de Sorocaba e morava nos fundos de uma lojinha de material de construção, que  havia montado resolvido  em parceria com um amigo. A expectativa do final do ano se aproximava e a situação não mudava. Não havia dinheiro e a possibilidade de consegui-lo estava cada vez mais escassa.

Quando encontrei com o Inácio há cerca de 02 anos antes, ele era um vendedor de materiais de construção em Sorocaba da Loja Monteiro,  empresa já extinta, e eu era o gerente da Concrebrás, uma empresa de concreto usinado e no relacionamento comercial surgiu a ideia de montar uma loja de material de construção, onde venderíamos produtos contra pedidos. Não tínhamos dinheiro suficiente para ter uma loja com estoque e optamos então por montar um show room com diversos tipos de azulejos, pisos, louças e metais sanitários e criamos um nome bem sugestivo para a loja, que se chamou MAGO ACABAMENTOS.

Este nome foi criado da junção dos nossos sobrenomes, Marchetti e Gonçalves e a nossa pequena loja começou a funcionar no início de 1984. A euforia da inauguração foi muito festejada por nós, afinal estávamos realizando o sonho de ter nosso próprio negócio. O barracão onde montamos a empresa tinha uma estrutura bem simples, um espaço de 10 metros de largura, 20 metros de comprimento, 02 banheiros, piso de cimento e no fundo um pequeno quintal. Antes de nós, naquele local funcionava uma oficina mecânica. Nos fundos da loja, montamos um escritório, com uma mesa, um cofre, um arquivo, um sofá para atender os eventuais clientes. Com o passar dos dias, este local passou a ser minha casa. A noite eu guardava o meu chevette dentro da loja e dormia no sofá do escritório. Para as refeições, tinha um pequeno fogão e pelo tempo que a loja existiu a refeição  era sopão e polentina, pois além de ser mais fácil cozinhar, era o que eu sabia fazer.

Como todo início de projeto, todos os sonhos são grandiosos, mas a realidade nem sempre acompanha os devaneios dos sonhadores. Temos que fazer uma reforma no prédio, colocar piso, pintar as paredes, colocar expositores chamativos. Esta era a nossa conversa do dia a dia e o nosso desejo era realiza-los, à medida que as vendas fossem prosperando e o dinheiro sobrando, que na verdade nunca aconteceu. Quando fazíamos alguma venda, o processo era emitir o pedido, fazer uma nota fiscal da compra e ir numa financeira trocar a dita nota e com o dinheiro comprar o material vendido para entregar ao cliente. Era literalmente vender o almoço para comer a janta. Esta rotina foi se repetindo pelos meses de 1984 e nada de novo acontecia, mas de repente, as coisas começaram a mudar.

A alegria durou muito pouco

Conseguirmos fechar a venda de pisos para um prédio de apartamentos e como o volume era grande para o nosso cacife, conseguimos comprar direto o piso da fábrica Giotoku. Com a liberação do credito, aproveitamos e compramos um pequeno estoque, que  seria o início do nosso projeto de finalmente ter uma loja, mas o sonho foi uma bola de sabão; explodiu assim que foi criada. No dia seguinte à chegada do estoque de piso em nossa lojinha, eu estava na cidade visitando clientes, quando o Inácio me ligou dizendo que havia feito um excelente negócio, pois tinha vendido com um bom lucro todo o piso que havíamos recebido e que o cliente já havia carregado e que fizera o pagamento com cheque. Não deu outra. O cheque não tinha fundos e nunca conseguimos localizar o emitente e perdemos tudo. Não demorou que a dívida que tínhamos com a fábrica virou o motivo de começarmos a perder tudo e a firma acabou falindo.

Bateu o desespero. Não tinha dinheiro para comprar material, os fornecedores já não aceitavam os nossos cheques e o nosso estoque havia evaporado, a solução encontrada foi começar a procurar emprego e foi aí que a LTN entrou em minha vida. A semana havia sido desastrosa. Não havia acontecido nenhuma venda e para piorar o quadro, um pouco de dinheiro que restava, teve que ser usado para consertar o carro do Inácio. Ao terminar o trabalho no sábado à tarde, tinha no caixa o dinheiro suficiente para comprar um botijão de gás para abastecer meu carro, comprar uns pacotes de sopão e comprar o “Estadão”, jornal onde era, na época, publicado os anúncios de empregos. 

Passei quase todo o domingo selecionando classificados e entre eles, tinha dois que estavam dentro do meu perfil: a LTN e a IOB. O anuncio da IOB oferecia uma possibilidade de ganho imediato – era o que precisava – e a LTN oferecia tudo que eu não tinha, ou seja, comida, gasolina e um lugar para dormir e vinha de encontro ao meu desejo maior que era ter um emprego que me permitisse viajar. Parecia perfeito, tinha que dar certo!

Na segunda feira, logo pela manhã, liguei para a LTN e fui muito bem atendido e já marcaram uma entrevista para o dia seguinte na Rua Martins Fontes, 230, no centro da cidade de São Paulo. Embora eu já tivesse alguma experiência em vendas, sempre tive minhas atividades profissionais voltadas para um público diferente, vendendo material de construção para o consumidor final e meus clientes, na sua grande maioria era formada por pessoas humildes e era dentro desta simplicidade que eu vivia. Nunca tinha usado um terno para trabalhar e preocupação com roupas, sapatos, unhas e cabelos não eram as minhas prioridades. Da mesma maneira que eu visitava obras, fui a entrevista na LTN. Me recordo que na ocasião estava utilizando um sapato surrado, calça jeans meia vida e camisa de manga curta e ao chegar no prédio onde funcionava a editora, o primeiro susto: Eu era um estranho no ninho. Parecia a porta de uma igreja evangélica de hoje. Os homens de ternos, gravatas, pastas estilo 007 e as mulheres todas de roupas sociais. Creio que havia mais de 50 pessoas para serem entrevistadas. Não posso afirmar, pois estava muito nervoso, mas creio que era o único que não estava devidamente trajado para uma entrevista de emprego, mas já era tarde para recuar. Já que estava lá, tinha que ver o que poderia acontecer.

O primeiro passo da entrevista foi o preenchimento da ficha de informações pessoais, experiências profissionais e todo o procedimento burocrático de praxe. Isto aconteceu no período da manhã e a tarde retornamos para as entrevistas e testes psicotécnicos, não recordo de todos, mas neste dia tive contato pela primeira vez com o Sr. Thomaz, com o Manoel, com o Falco, com o Sidney, com a Ana Maria e com outros entrevistadores, que eram os supervisores da época. Foram várias entrevistas e no final do dia, o Thomaz agradece a nossa presença e promete dar uma resposta aos candidatos escolhidos até a próxima sexta feira, pois os treinamentos  iriam ter seu início na segunda feira seguinte. Confesso que sai dali ansioso, mas frustrado, pois queria ter a certeza que seria contratado e com esta incerteza, voltei para a minha rotina em Sorocaba.

Na quarta-feira, dois dias depois de ter feito os testes eu estava no meu limite. Já não tinha dinheiro nem para comprar comida, não tinha gás para o carro e estava sem nenhuma saída e resolvi ligar para a LTN. Era tudo ou nada. Se fosse nada, estava decidido voltar para Descalvado e trabalhar no que fosse possível para sobreviver, mas não ficaria mais em Sorocaba. Já havíamos decidido que iriamos fechar a loja e devolver o prédio e o prazo de encerramento do contrato de locação era naquela semana. Estava literalmente no meu limite. Se a LTN me aceitasse, então eu iria ficar até domingo na minha casa, em Descalvado, com minha família, para poder me apresentar em São Paulo para iniciar o curso. Usando o telefone emprestado da transportadora, vizinha de nossa lojinha,pois o nosso já estava cortado, fiz a ligação e falei com o Departamento Pessoal, que disseram que ainda estavam analisando os candidatos e que não tinham ainda definição. Argumentei com a pessoa que me atendeu que estava ansioso pelo resultado e que esperava ser aproveitado, pois havia gostado muito da empresa e que a contratação seria um sonho para mim. Parece que meu apelo surtiu efeito, pois a pessoa pediu que eu ligasse dentro de 02 horas e ela daria uma posição final.
Praça Dom José Gaspar, onde começou a LTN
Foram 02 horas de agonia e quando ligo novamente a pessoa que havia me atendido estava em horário de almoço. Pediram para retornar a ligação mais tarde e quando o fiz novamente, fui atendido pelo Sr. Thomaz, que conversou um pouco comigo e disse que iria verificar para eu aguardar uns instantes. Estas ligações eram um grande problema para mim, pois na época os telefonemas interurbanos eram feitos por aquelas fichas de orelhão, ou então você quando terminava a ligação, a Telesp informava o custo da ligação e eu teria que pagar ao meu vizinho. Estava agoniado com a espera e com o custo da ligação, quando o Thomaz voltou a linha e disse que eu havia sido aprovado no processo de seleção e que devia me apresentar na segunda feira para iniciar o curso. Como eu morava fora de São Paulo, eu poderia chegar no domingo e me hospedar no Hotel Bristol, que ficava defronte a LTN.

Um café da manha deste porte para quem só vivia de pão e água

Naquele mesmo dia deixei tudo para trás em Sorocaba e fui para Descalvado contar as boas novas para a família. Não tinha ideia de qual seria o desafio, que tipo de trabalho seria realmente realizado, nem quanto iria ganhar. Contei para minha família que nossa vida iria mudar e era isso o que importava. A Zezé arrumou umas roupas para eu poder levar e passar a semana e finalmente no domingo à tarde, emprestei dinheiro de parentes e tomei um ônibus para São Paulo e cheguei no hotel por volta de 19 horas. Quando entrei no saguão do hotel fiquei encantado. Eu nunca tinha entrado num ambiente como aquele e já na portaria conheci o primeiro amigo na LTN, que estava chegando no hotel naquele mesmo momento, era Irineu Vilella Avansi, que estava chegando de Andradina. Estava finalmente no lugar que iria mudar minha vida para sempre e muitas historias aconteceram, mas fica para a próxima publicação.