quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Capitulo 1 – Em busca de um sonho

O Natal daquele ano seria o pior de todos os tempos. Não havia dinheiro para comprar nem uma simples lembrança para as crianças que moravam junto com a mãe na cidade de Descalvado, onde para ajudar no orçamento, a Zezé,minha esposa,  ia diariamente com meus filhos, apanhar algodão numa fazenda próxima. O que ela conseguia dava para comprar o pão e o leite das crianças e o que eu contribuía, dava para pagar o aluguel e comprar alguma comida. Eu trabalhava na cidade de Sorocaba e morava nos fundos de uma lojinha de material de construção, que eu havia resolvido montar em parceria com um amigo. A expectativa do final do ano se aproximava e a situação não mudava. Não havia dinheiro e a possibilidade de consegui-lo estava cada vez mais escassa.

Quando encontrei com o Inácio há cerca de 02 anos antes, ele era um vendedor de materiais de construção da Loja Monteiro, da cidade de Sorocaba, empresa já extinta, e eu era o representante de uma empresa de concreto, a Concrebrás, daquela cidade e no relacionamento comercial surgiu a ideia de montar uma loja de material de construção, onde venderíamos produtos contra pedidos. Não tínhamos dinheiro suficiente para ter uma loja com estoque e optamos então por montar um show room com diversos tipos de azulejos, pisos, louças e metais sanitários e criamos um nome bem sugestivo para a loja, que se chamou MAGO ACABAMENTOS.

Este nome foi criado da junção dos nossos sobrenomes, Marchetti e Gonçalves e a nossa pequena loja começou a funcionar no início de 1984. A euforia da inauguração foi muito festejada por nós, afinal estávamos realizando um sonho de ter nosso próprio negócio. O barracão onde montamos a empresa tinha uma estrutura bem simples, um espaço de 10 metros de largura, 20 metros de comprimento, 02 banheiros, piso de cimento e no fundo um pequeno quintal. Antes de nós, naquele local funcionava uma oficina mecânica. Nos fundos da loja, montamos um escritório, com uma mesa, um cofre, um arquivo, um sofá para atender os eventuais clientes. Com o passar dos dias, este local passou a ser minha casa.A noite eu guardava o meu chevette dentro da loja e dormia no sofá do escritório. Para as refeições, tinha um pequeno fogão e pelo tempo que a loja existiu a refeição predileta era sopão e polentina, pois além de ser mais fácil cozinhar, era o que eu sabia fazer.

Como todo início de projeto, todos os sonhos são grandiosos, mas a realidade nem sempre acompanha os devaneios dos sonhadores. Temos que fazer uma reforma no prédio, colocar piso, pintar as paredes, colocar expositores chamativos. Esta era a nossa conversa do dia a dia e o nosso desejo era realiza-los, à medida que as vendas fossem prosperando e o dinheiro sobrando, que na verdade nunca aconteceu. Quando fazíamos alguma venda, o processo era emitir o pedido, fazer uma nota fiscal da compra e ir numa financeira trocar a dita nota e com o dinheiro comprar o material vendido para entregar ao cliente. Era literalmente vender o almoço para comer a janta. Esta rotina foi se repetindo pelos meses de 1984 e nada de novo acontecia, mas de repente, as coisas começaram a mudar.

Conseguirmos fechar a venda de pisos para um prédio de apartamentos e como o volume era grande para o nosso cacife, conseguimos comprar direto o piso da fábrica Giotoku. Com a liberação do credito, aproveitamos e compramos um pequeno estoque, que na nossa opinião seria o início do nosso projeto de finalmente ter uma loja, mas o sonho foi uma bola de sabão; explodiu assim que foi criada. No dia seguinte à chegada do estoque de piso em nossa lojinha, eu estava na cidade visitando clientes, quando o Inácio me ligou dizendo que havia feito um excelente negócio, pois tinha vendido com um bom lucro todo o piso que havíamos recebido e que o cliente já havia carregado e que fizera o pagamento com cheque. Não deu outra. O cheque não tinha fundos e nunca conseguimos localizar o emitente e perdemos tudo. Não demorou que a dívida que tínhamos com a fábrica virou o motivo de começarmos a perder tudo e a firma acabou falindo.

Bateu o desespero. Não tinha dinheiro para comprar material, os fornecedores já não aceitavam os nossos cheques e o nosso estoque havia evaporado, a solução encontrada foi começar a procurar emprego e foi aí que a LTN entrou em minha vida. A semana havia sido desastrosa. Não havia acontecido nenhuma venda e para piorar o quadro, um pouco de dinheiro que restava, teve que ser usado para consertar o carro do Inácio. Ao terminar o trabalho no sábado à tarde, tinha no caixa o dinheiro suficiente para comprar um botijão de gás para abastecer meu carro, comprar uns pacotes de sopão e comprar o “Estadão”, jornal onde era, na época, publicado os anúncios de empregos. 

Passei quase todo o domingo selecionando classificados e entre eles, tinha dois que estavam dentro do meu perfil: a LTN e a IOB. O anuncio da IOB oferecia uma possibilidade de ganho imediato – era o que precisava – e a LTN oferecia tudo que eu não tinha, ou seja, comida, gasolina e um lugar para dormir e vinha de encontro ao meu desejo maior que era ter um emprego que me permitisse viajar. Parecia perfeito, tinha que dar certo!

Na segunda feira, logo pela manhã, liguei para a LTN e fui muito bem atendido e já marcaram uma entrevista para o dia seguinte na Rua Martins Fontes, 230, no centro da cidade de São Paulo. Embora eu já tivesse alguma experiência em vendas, sempre tive minhas atividades profissionais voltadas para um público diferente, pois vendia material de construção para o consumidor final e meus clientes, na sua grande maioria era formada por pessoas humildes e era dentro desta simplicidade que eu vivia. Nunca tinha usado um terno para trabalhar e preocupação com roupas, sapatos, unhas e cabelos não eram as minhas prioridades. Da mesma maneira que eu visitava obras, fui a entrevista na LTN. Me recordo que na ocasião estava utilizando um sapato surrado, calça jeans meia vida e camisa de manga curta e ao chegar no prédio onde funcionava a editora, o primeiro susto: Eu era um estranho no ninho. Parecia a porta de uma igreja evangélica de hoje. Os homens de ternos, gravatas, pastas estilo 007 e as mulheres todas de roupas sociais. Creio que havia mais de 50 pessoas para serem entrevistadas. Não posso afirmar, pois estava muito nervoso, mas creio que era o único que não estava devidamente trajado para uma entrevista de emprego, mas já era tarde para recuar. Já que estava lá, vamos ver o que poderia acontecer.

O primeiro passo da entrevista foi o preenchimento da ficha de informações pessoais, experiências profissionais e todo o procedimento burocrático de praxe. Isto aconteceu no período da manhã e a tarde retornamos para as entrevistas e testes psicotécnicos, não recordo de todos, mas neste dia tive contato pela primeira vez com o Sr. Thomaz, com o Manoel, com o Falco, com o Sidney, com a Ana Maria e com outros entrevistadores, que eram os supervisores da época. Foram várias entrevistas e no final do dia, o Thomaz agradece a nossa presença e promete dar uma resposta ais candidatos escolhidos até a próxima sexta feira, pois o treinamento para as pessoas escolhidas iria ter seu início na segunda feira seguinte. Confesso que sai dali ansioso, mas frustrado, pois queria ter a certeza que seria contratado e com esta incerteza, voltei para a minha rotina em Sorocaba.

Na quarta-feira, dois dias depois de ter feito os testes eu estava no meu limite. Já não tinha dinheiro nem para comprar comida, não tinha gás para o carro e estava sem nenhuma saída e resolvi ligar para a LTN. Era tudo ou nada. Se fosse nada, estava decidido voltar para Descalvado e trabalhar no que fosse possível para sobreviver, mas não ficaria mais em Sorocaba. Já havíamos decidido que iriamos fechar a loja e devolver o prédio e o prazo de encerramento do contrato de locação era naquela semana. Estava literalmente no meu limite. Se a LTN me aceitasse, então eu iria ficar até domingo na minha casa, em Descalvado, com minha família, para poder me apresentar em São Paulo para iniciar o curso. Usando o telefone emprestado da transportadora, vizinha de nossa lojinha,pois o nosso já estava cortado, fiz a ligação e falei com o Departamento Pessoal, que disseram que ainda estavam analisando os candidatos e que não tinham ainda definição. Argumentei com a pessoa que me atendeu que estava ansioso pelo resultado e que esperava ser aproveitado, pois havia gostado muito da empresa e que a contratação seria um sonho para mim. Parece que meu apelo surtiu efeito, pois a pessoa pediu que eu ligasse dentro de 02 horas e ela daria uma posição final.
Praça Dom José Gaspar, onde começou a LTN

Foram 02 horas de agonia e quando ligo novamente a pessoa que havia me atendido estava em horário de almoço. Pediram para retornar a ligação mais tarde e quando o fiz novamente, fui atendido pelo Sr. Thomaz, que conversou um pouco comigo e disse que iria verificar para eu aguardar uns instantes. Estas ligações eram um grande problema para mim, pois na época os telefonemas interurbanos eram feitos por aquelas fichas de orelhão, ou então você quando terminava a ligação, a Telesp informava o custo da ligação e eu teria que pagar ao meu vizinho. Estava agoniado com a espera e com o custo da ligação, quando o Thomaz voltou a linha e disse que eu havia sido aprovado no processo de seleção e que devia me apresentar na segunda feira para iniciar o curso. Como eu morava fora de São Paulo, eu poderia chegar no domingo e me hospedar no Hotel Bristol, que ficava defronte a LTN.

Naquele mesmo dia deixei tudo para trás em Sorocaba e fui para Descalvado contar as boas novas para a família. Não tinha ideia de qual seria o desafio, que tipo de trabalho seria realmente realizado, nem quanto iria ganhar. Contei para minha família que nossa vida iria mudar e era isso o que importava. A Zezé arrumou umas roupas para eu poder levar e passar a semana e finalmente no domingo à tarde, emprestei dinheiro de parentes e tomei um ônibus para São Paulo e cheguei no hotel por volta de 19 horas. Quando entrei no saguão do hotel fiquei encantado. Eu nunca tinha entrado num ambiente como aquele e já na portaria conheci o primeiro amigo na LTN, que estava chegando no hotel naquele mesmo momento, era Irineu Vilella Avansi, que estava chegando de Andradina. Estava finalmente no lugar que iria mudar minha vida para sempre.


Um comentário:

  1. Que emocionante, Luis quero ler e vibrar em todos os capitulos das historias das vidas reais!!!! :-)
    Abraço da sua amiga Nay

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