sábado, 14 de janeiro de 2017

Capitulo 7 –  A cidade maravilhosa.

Era a primeira vez que eu ia a cidade do Rio de Janeiro e estava ansioso e curioso para conhecer a Cidade Maravilhosa, suas belezas naturais, ir até o Corcovado, visitar o Cristo Redentor, fazer o passeio de bondinho até o Pão de Açúcar, curtir as praias de Copacabana e Ipanema. Era tudo um sonho que eu levava comigo na imaginação, e esperava realiza-lo quando lá estivesse. Nosso ponto de encontro foi o Hotel São Francisco, localizado na esquina da Avenida Presidente Vargas com a Avenida Rio Branco, bem no centro da cidade. Era um movimento de gente passando pelo local, que eu nunca tinha visto até então. À noite, como por encanto, aquele local que era um verdadeiro congestionamento humano, ficava praticamente deserto. Próximo do hotel tinha um restaurante e lá que os listeiros se reuniam para conversar após o trabalho.


O Hotel São Francisco está instalado num prédio antigo e não tinha a mesma qualidade dos hotéis que havíamos ficado em Porto Alegre, Blumenau, Curitiba, Londrina e São Paulo, mas tinha um bom café da manhã, que ainda era a única refeição decente do dia. O café da manhã deste hotel era servido também numa grande mesa, com diversos tipos de alimentos, mas tinha uma diferença que ajudava muito, que era a forma como os alimentos eram servidos. Os bolos eram todos em embalagens individuais, bem como os danones e os achocolatados e aí fazíamos a festa. O paletó de couro que eu ainda usava era um deposito para guardar comida. Enchia todos os bolsos com o que conseguia pegar e guardava no frigobar do apartamento. O café da manhã passou a ser também o jantar. E não era somente eu quem fazia isto. Quando o café terminava para os listeiros, a mesa que ficava os bolos e pães ficava praticamente limpa. As copeiras nem se importavam com isso, pois repunham tudo rapidamente.


O sonho de conhecer os pontos turísticos da cidade foi ficando distante, pois tudo era muito caro e os ingressos para fazer uma visita ao Cristo Redentor ou mesmo conhecer o Pão de Açúcar era completamente impossível naquele momento diante do dinheiro que dispunha. Ficaria para uma próxima vez. Dava uma pontinha de inveja dos veteranos, que tinham dinheiro para frequentar bons restaurantes, boates, enquanto a gente, comia pão do café da manhã, que ficava guardado durante o dia na geladeira do frigobar.

Durante a campanha em Porto Alegre, o vendedor Brito, conheceu uma gaúcha muito bonita e aparentemente com muito dinheiro. Ela se apaixonou e veio atrás dele no Rio de Janeiro e eles se hospedaram numa suíte do Hotel Novo Mundo. Como tinha feito amizade com ela em Porto Alegre e o Brito era meu amigo de TJ, ia sempre a noite, após o atendimento visita-los. Ela ficou no Rio por uns 10 dias e saímos algumas vezes para jantar em alguns restaurantes, tudo pago por ela. Não sei como tudo terminou, mas ficou uma boa lembrança, tanto da gaúcha como do Hotel Novo Mundo, pois dali se avistava o Pão de Açúcar e também o Corcovado e na frente tinha a Marina da Gloria e o imenso jardim do Aterro do Flamengo, que foi construído pelo homem, roubando aquela faixa de terra do mar. É um lugar muito bonito e vizinho de um lugar histórico, o Palácio do Catete, onde funcionou o Governo Federal até sua transferência para o Palácio Guanabara e posteriormente para Brasília. Neste palácio foi que houve o suicídio de Getúlio Vargas.

Ainda, depois de tantos anos, recordo das tiradas do Cavalcante, que dizia para as mulheres “força nas tetas amiga, se não vende” ou quando defendia um contrato junto a um cliente que reclamava do valor cobrado. Ele dizia com a maior tranquilidade – “ O senhor precisa engessar a mão, já que não lê o que assina” Do jeito dele, pegava no pé do vendedor mesmo.

Bem, certa feita peguei uma ficha de novo da empresa Tintas Internacional, de Niterói e como eu era especialista em fazer IA e com um pouco de coragem uma MA, naquele dia, me enchi de valentia e consegui fazer um contrato de valor alto para meus padrões, nada comparado com os faixas A, mas era um bom contrato e o dito cujo que me atendeu assinou o contrato e colocou o cargo Controller. Sai da empresa rapidinho e a noite entreguei o contrato para o Cavaca e ele até me elogiou para a equipe. Peguei uma boa atribuição, mas no dia seguinte, à tarde, no atendimento, ele me devolve o contrato, dizendo que o cliente não havia colocado o extenso. Na hora fiquei gelado e no dia seguinte tive que voltar no cliente, confesso que suava frio, mas no fim tudo terminou bem, pois o cliente utilizava muito o telex na época e achou conveniente pagar o que estava sendo cobrado pela publicidade. O contrato entrou, foi publicado e renovado no ano seguinte.

Uma outra ocasião fui atribuída com fichas do Bairro de Madureira e Bangu e tinha um vendedor chamado Brito, que também tinha fichas naquela região e resolvemos burlar as ordens da supervisão, resolvemos sair em TJ, em meu carro, pelo fato de ser mais econômico, pois era movido a gás. Quem já trabalhou no Rio de Janeiro ou conhece aquela cidade, sabe que ela é imensa e os locais que iriamos trabalhar distavam cerca de 50 quilômetros do centro e lá não lembrava nada as belezas naturais da cidade, eram bairros simples, muito habitados, mau sinalizados.

Em suma, era complicado localizar os endereços das empresas a serem visitadas e como na época ainda não tínhamos GPS, o único recurso que sobrava era ir perguntando para um, para outro, mas o trabalho não rendia. Perdia-se muito tempo com isso e resolvemos então contratar uma pessoa da região para ir conosco. Escolhemos um rapaz de uns 25, falante, simpático e jurava que conhecia tudo. No começo funcionou bem, ele nos levou a uns endereços e o dia estava prometendo ser produtivo. O que não sabíamos é que este rapaz era epilético e quando estávamos nos dirigindo ao um endereço ele teve uma crise e começou a tremer e a babar. Ficamos em desespero e por acaso encontramos um carro de polícia, que nos ajudou a descer o rapaz do carro e o deitamos na calçada. Quando ele melhorou, pagamos a ele e seguimos nosso trabalho sozinho.

Dias depois, voltei a região, desta vez sozinho e confesso que passei o maior medo de minha vida. Estava visitando as empresas e com a mesma dificuldade de localizar os endereços, quando entrei numa rua estreita e fui abordado por um grupo de malandros, que cercaram o carro e vieram com ameaças que estava invadindo o território deles. Expliquei que estava trabalhando, que morava no interior de São Paulo e estava perdido, procurando endereços de empresas. O chefe daquela turma disse que eu parecia ser um cara legal, mas teria que dar uma carona para eles até um outro bairro. Claro, respondi, podem entrar. E entraram seis sujeitos e se amontoaram no banco traseiro do Chevette e na frente, no banco do passageiro, sentou o chefe da gangue e daquela maneira, rodei uns 10 quilômetros pela região de Bangu. Confesso que temia pela minha vida, pensava na minha família, mas o medo era tanto que se transformou em calma e consegui levar o pessoal até onde eles queriam. Quando descera do carro, o chefe deles me agradeceu e desejou boa sorte. Sai dali e voltei direto para o Hotel.

Naquele dia voltei improdutivo e as fichas de novo que eu tinha ficaram sem visitas. Contei o caso para o Cavalcante, que tirou um sarro com minha cara, mas entendeu o momento.Assim, as semanas foram passando e estávamos terminando a campanha no Rio e só restava uma parte de São Paulo para encerrar a campanha do GBT e em seguida as equipes seriam trocadas e passaríamos a trabalhar lista telefônica. Antes de sair do Rio de Janeiro, teve uma situação que merece ser contada. Foi numa sexta feira.

Hoje quem fala no Manoel Norberto Santander vem em primeiro momento a imagem daquele cara alegre, brincalhão, bom papo e um grande amigo, mas ele era foda como supervisor chefe, pegava no pé mesmo, principalmente dos pezinhos e eu era um deles, ainda era um vendedor iniciante e quando chegava para ser atendido pelo Cavalcante sempre ficava inseguro, pois minha produção era sempre pequena e como vendedor vive de produção, sempre ficava a sombra de uma possível demissão. Eu não conversava com nenhum dos chefes, salvo se me perguntassem alguma coisa. Exclusivamente, para mim, o Cavalcante era a LTN. Falar então com o Manoel, com o Falco ou com o Sidney nem pensar. Suava frio se precisasse faze-lo.

Num final de semana eu resolvi ir visitar minha família em Descalvado e para minha surpresa, o Manoel, num raro momento, conversou comigo e disse que seu eu fosse para casa ele iria comigo.  Bem, como já contei anteriormente, eu tinha um Chevette a gás e o carro já estava no limite da resistência. Como tinha medo que o carro não fosse aguentar a viagem, pedi emprestado o carro da Guerreiro, um Passat, que ela deixava na garagem do hotel e levava apenas para mostrar que estava com carro, pois só trabalhava de TJ ou de táxi.

Bem, saímos do Rio de Janeiro por volta das 18 horas e o Manoel na dele. De vez em quando trocávamos algumas palavras, mas como a gente não tinha nada em comum, a não ser o trabalho, o silencio era enorme. Minha missão: leva-lo a Ribeirão Preto, depois ir a Descalvado, onde morava e no domingo pega-lo em sua casa em Ribeirão Preto para estarmos no Rio de Janeiro na segunda de manhã. O roteiro foi cumprido, mas as conversas ficaram para muito tempo depois e a nossa amizade também. Hoje, tenho o Manoel como um dos melhores amigos que tive em todos os tempos e sinto muito orgulho disso. Tivemos muitos momentos alegres, alguns difíceis, mas sempre estivemos dando força um para o outro e isso permanece até hoje.
A campanha no Rio de Janeiro de tantas belezas tinha chegado fim. Agora restava enfrentar a Via Dutra e voltar para o Hotel Bristol, onde encerraríamos o GBT daquele ano.


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