Capitulo 7 – A cidade maravilhosa.
Era a primeira vez que eu ia a
cidade do Rio de Janeiro e estava ansioso e curioso para conhecer a Cidade
Maravilhosa, suas belezas naturais, ir até o Corcovado, visitar o Cristo
Redentor, fazer o passeio de bondinho até o Pão de Açúcar, curtir as praias de
Copacabana e Ipanema. Era tudo um sonho que eu levava comigo na imaginação, e
esperava realiza-lo quando lá estivesse. Nosso ponto de encontro foi o Hotel
São Francisco, localizado na esquina da Avenida Presidente Vargas com a Avenida
Rio Branco, bem no centro da cidade. Era um movimento de gente passando pelo
local, que eu nunca tinha visto até então. À noite, como por encanto, aquele
local que era um verdadeiro congestionamento humano, ficava praticamente
deserto. Próximo do hotel tinha um restaurante e lá que os listeiros se reuniam
para conversar após o trabalho.
O Hotel São Francisco está
instalado num prédio antigo e não tinha a mesma qualidade dos hotéis que
havíamos ficado em Porto Alegre, Blumenau, Curitiba, Londrina e São Paulo, mas
tinha um bom café da manhã, que ainda era a única refeição decente do dia. O
café da manhã deste hotel era servido também numa grande mesa, com diversos
tipos de alimentos, mas tinha uma diferença que ajudava muito, que era a forma
como os alimentos eram servidos. Os bolos eram todos em embalagens individuais,
bem como os danones e os achocolatados e aí fazíamos a festa. O paletó de couro
que eu ainda usava era um deposito para guardar comida. Enchia todos os bolsos
com o que conseguia pegar e guardava no frigobar do apartamento. O café da
manhã passou a ser também o jantar. E não era somente eu quem fazia isto.
Quando o café terminava para os listeiros, a mesa que ficava os bolos e pães
ficava praticamente limpa. As copeiras nem se importavam com isso, pois
repunham tudo rapidamente.
O sonho de conhecer os pontos
turísticos da cidade foi ficando distante, pois tudo era muito caro e os ingressos
para fazer uma visita ao Cristo Redentor ou mesmo conhecer o Pão de Açúcar era
completamente impossível naquele momento diante do dinheiro que dispunha.
Ficaria para uma próxima vez. Dava uma pontinha de inveja dos veteranos, que
tinham dinheiro para frequentar bons restaurantes, boates, enquanto a gente,
comia pão do café da manhã, que ficava guardado durante o dia na geladeira do
frigobar.
Durante a campanha em Porto
Alegre, o vendedor Brito, conheceu uma gaúcha muito bonita e aparentemente com
muito dinheiro. Ela se apaixonou e veio atrás dele no Rio de Janeiro e eles se
hospedaram numa suíte do Hotel Novo Mundo. Como tinha feito amizade com ela em
Porto Alegre e o Brito era meu amigo de TJ, ia sempre a noite, após o
atendimento visita-los. Ela ficou no Rio por uns 10 dias e saímos algumas vezes
para jantar em alguns restaurantes, tudo pago por ela. Não sei como tudo
terminou, mas ficou uma boa lembrança, tanto da gaúcha como do Hotel Novo
Mundo, pois dali se avistava o Pão de Açúcar e também o Corcovado e na frente
tinha a Marina da Gloria e o imenso jardim do Aterro do Flamengo, que foi construído
pelo homem, roubando aquela faixa de terra do mar. É um lugar muito bonito e
vizinho de um lugar histórico, o Palácio do Catete, onde funcionou o Governo
Federal até sua transferência para o Palácio Guanabara e posteriormente para
Brasília. Neste palácio foi que houve o suicídio de Getúlio Vargas.
Ainda, depois de tantos anos, recordo
das tiradas do Cavalcante, que dizia para as mulheres “força nas tetas amiga,
se não vende” ou quando defendia um contrato junto a um cliente que reclamava
do valor cobrado. Ele dizia com a maior tranquilidade – “ O senhor precisa
engessar a mão, já que não lê o que assina” Do jeito dele, pegava no pé do
vendedor mesmo.
Bem, certa feita peguei uma
ficha de novo da empresa Tintas Internacional, de Niterói e como eu era
especialista em fazer IA e com um pouco de coragem uma MA, naquele dia, me
enchi de valentia e consegui fazer um contrato de valor alto para meus padrões,
nada comparado com os faixas A, mas era um bom contrato e o dito cujo que me
atendeu assinou o contrato e colocou o cargo Controller. Sai da empresa
rapidinho e a noite entreguei o contrato para o Cavaca e ele até me elogiou
para a equipe. Peguei uma boa atribuição, mas no dia seguinte, à tarde, no
atendimento, ele me devolve o contrato, dizendo que o cliente não havia
colocado o extenso. Na hora fiquei gelado e no dia seguinte tive que voltar no
cliente, confesso que suava frio, mas no fim tudo terminou bem, pois o cliente
utilizava muito o telex na época e achou conveniente pagar o que estava sendo
cobrado pela publicidade. O contrato entrou, foi publicado e renovado no ano
seguinte.
Uma outra ocasião fui
atribuída com fichas do Bairro de Madureira e Bangu e tinha um vendedor chamado
Brito, que também tinha fichas naquela região e resolvemos burlar as ordens da
supervisão, resolvemos sair em TJ, em meu carro, pelo fato de ser mais
econômico, pois era movido a gás. Quem já trabalhou no Rio de Janeiro ou
conhece aquela cidade, sabe que ela é imensa e os locais que iriamos trabalhar
distavam cerca de 50 quilômetros do centro e lá não lembrava nada as belezas
naturais da cidade, eram bairros simples, muito habitados, mau sinalizados.
Em suma, era complicado
localizar os endereços das empresas a serem visitadas e como na época ainda não
tínhamos GPS, o único recurso que sobrava era ir perguntando para um, para
outro, mas o trabalho não rendia. Perdia-se muito tempo com isso e resolvemos
então contratar uma pessoa da região para ir conosco. Escolhemos um rapaz de
uns 25, falante, simpático e jurava que conhecia tudo. No começo funcionou bem,
ele nos levou a uns endereços e o dia estava prometendo ser produtivo. O que
não sabíamos é que este rapaz era epilético e quando estávamos nos dirigindo ao
um endereço ele teve uma crise e começou a tremer e a babar. Ficamos em
desespero e por acaso encontramos um carro de polícia, que nos ajudou a descer
o rapaz do carro e o deitamos na calçada. Quando ele melhorou, pagamos a ele e
seguimos nosso trabalho sozinho.
Dias depois, voltei a região,
desta vez sozinho e confesso que passei o maior medo de minha vida. Estava
visitando as empresas e com a mesma dificuldade de localizar os endereços,
quando entrei numa rua estreita e fui abordado por um grupo de malandros, que
cercaram o carro e vieram com ameaças que estava invadindo o território deles.
Expliquei que estava trabalhando, que morava no interior de São Paulo e estava
perdido, procurando endereços de empresas. O chefe daquela turma disse que eu
parecia ser um cara legal, mas teria que dar uma carona para eles até um outro
bairro. Claro, respondi, podem entrar. E entraram seis sujeitos e se amontoaram
no banco traseiro do Chevette e na frente, no banco do passageiro, sentou o
chefe da gangue e daquela maneira, rodei uns 10 quilômetros pela região de
Bangu. Confesso que temia pela minha vida, pensava na minha família, mas o medo
era tanto que se transformou em calma e consegui levar o pessoal até onde eles
queriam. Quando descera do carro, o chefe deles me agradeceu e desejou boa
sorte. Sai dali e voltei direto para o Hotel.
Naquele dia voltei improdutivo
e as fichas de novo que eu tinha ficaram sem visitas. Contei o caso para o
Cavalcante, que tirou um sarro com minha cara, mas entendeu o momento.Assim, as semanas foram
passando e estávamos terminando a campanha no Rio e só restava uma parte de São
Paulo para encerrar a campanha do GBT e em seguida as equipes seriam trocadas e
passaríamos a trabalhar lista telefônica. Antes de sair do Rio de Janeiro, teve
uma situação que merece ser contada. Foi numa sexta feira.
Hoje quem fala no Manoel
Norberto Santander vem em primeiro momento a imagem daquele cara alegre,
brincalhão, bom papo e um grande amigo, mas ele era foda como supervisor chefe,
pegava no pé mesmo, principalmente dos pezinhos e eu era um deles, ainda era um
vendedor iniciante e quando chegava para ser atendido pelo Cavalcante sempre
ficava inseguro, pois minha produção era sempre pequena e como vendedor vive de
produção, sempre ficava a sombra de uma possível demissão. Eu não conversava
com nenhum dos chefes, salvo se me perguntassem alguma coisa. Exclusivamente,
para mim, o Cavalcante era a LTN. Falar então com o Manoel, com o Falco ou com
o Sidney nem pensar. Suava frio se precisasse faze-lo.
Num final de semana eu resolvi
ir visitar minha família em Descalvado e para minha surpresa, o Manoel, num
raro momento, conversou comigo e disse que seu eu fosse para casa ele iria
comigo. Bem, como já contei
anteriormente, eu tinha um Chevette a gás e o carro já estava no limite da
resistência. Como tinha medo que o carro não fosse aguentar a viagem, pedi
emprestado o carro da Guerreiro, um Passat, que ela deixava na garagem do hotel
e levava apenas para mostrar que estava com carro, pois só trabalhava de TJ ou
de táxi.
Bem, saímos do Rio de Janeiro
por volta das 18 horas e o Manoel na dele. De vez em quando trocávamos algumas
palavras, mas como a gente não tinha nada em comum, a não ser o trabalho, o
silencio era enorme. Minha missão: leva-lo a Ribeirão Preto, depois ir a
Descalvado, onde morava e no domingo pega-lo em sua casa em Ribeirão Preto para
estarmos no Rio de Janeiro na segunda de manhã. O roteiro foi cumprido, mas as
conversas ficaram para muito tempo depois e a nossa amizade também. Hoje, tenho
o Manoel como um dos melhores amigos que tive em todos os tempos e sinto muito
orgulho disso. Tivemos muitos momentos alegres, alguns difíceis, mas sempre
estivemos dando força um para o outro e isso permanece até hoje.
A campanha no Rio de Janeiro
de tantas belezas tinha chegado fim. Agora restava enfrentar a Via Dutra e
voltar para o Hotel Bristol, onde encerraríamos o GBT daquele ano.
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